A Partida
Okuribito (A Partida no Brasil ) é um filme japonês de 2008 dirigido por Yojiro Takita. Foi o vencedor do prêmio Oscar de melhor filme estrangeiro em 2009. Data de lançamento: 13 de setembro de 2008 (Japão).
A Partida de Yojiro Takita, é obra de imagens convencionais, mas de linguagem lírica, competentemente dirigida, que recorre a uma tradicional cerimônia fúnebre japonesa para mostrar, como se deve, pela superação das perdas afetivas, valorizar cada momento da vida.
Creio na dicotomia. O titulo poderia ser: a partida e a chegada ou A Partida e sua conclusão.
Há tantas surpresas na vida.
Momento dele:
– Seu luto não elaborado pela perda da mãe decide retornar a sua cidade para morar na própria casa, vazia desde que sua mãe morrera, há algum tempo, sem que ele pudesse estar presente aos funerais;
– A dissolução da orquestra e a necessidade de se achar, para envolver mais o espectador, na evolução do tema, difícil, pois que de caráter lúgubre, Takita não só soube dosar a narrativa com algumas situações cômicas, como conseguiu tirar proveito da magnífica trilha sonora de Joe Hisaishi, composta – além da bela canção-tema de sua autoria – de peças como o Hino à Alegria, da Nona Sinfonia, de Beethoven, com coro e orquestra, a Ave Maria, de Gounod, e o Wiegenlied, de Brahms, em solo de violoncelo;
– A relação conflitiva com o pai que não o abandonava o tempo todo;
– O casamento e seus conflitos: ser pai, antes de ter se entendido com o próprio pai, é interessante observar como essa mudança na vida do protagonista engloba vários aspectos. É uma volta para a cidade natal, mas, além disso, uma volta para o passado, para o contato com pessoas de outrora e com traumas de outrora – o relacionamento mal resolvido com o pai ressurge de forma decisiva.
Polvo – voltar para sua origem. O mesmo sucedeu com ele. O polvo que quase morto, voltou para as águas. Quando a orquestra foi dissolvida levou o protagonista de volta à cidade onde foi criado, no interior do Japão.
Vou abordar meus comentários em 3 tempos:
1 – Procuramos em nossa vida atual evitar a dor e negar o que não gostamos. Esse filme é fascinante à medida que nos mostra uma vivencia no sentido contrario. Ir de encontro à dor.
Quando evitamos a dor, evitamos também o prazer. Quando nos deparamos com a dor, nos deparamos com uma outra dimensão do prazer. Imaginando ser uma agência de turismo, Kobayashi se candidata ao cargo na empresa, mas descobre que o cargo disponível é numa funerária, como o profissional que prepara os corpos dos mortos antes de serem enterrados, ritual conhecido no Japão como nokanshi. Aos poucos, ele mesmo torna-se cada vez mais orgulhoso da função, tomando gosto pelo aperfeiçoamento na arte do nokanshi, agindo como um guardião dos portões que dividem a vida e a morte. Há um desinteresse do público em relação à orquestra. Há uma decadência da casa de banhos. As coisas mudam e, principalmente, a prática do protagonista, a de conduzir o último ritual antes da cremação do morto, uma cerimônia tão repleta de simbologias e, principalmente, respeito por um corpo que está prestes a ser transformado em cinzas.
2 – Quando é oferecido para o ser humano uma grande contenção de sua dor – quanto afeto aparece, inclusive o de gratidão e reparação! Quando a pessoa morre, seus familiares contratam os serviços de Daigo e seu patrão, para deixar o morto mais bonito e mais bem arrumado para a passagem de mundos que a morte propicia. Mostra o preconceito com quem trabalha nesse ramo e a necessidade de todo mundo de rever a própria vida, a partir da morte. Talvez essa seja a maior função para os que ficam, rever padrões, atitudes, escolhas. O filme proporciona ao personagem esse mergulho nos reais significados da vida e vai oferecendo ao expectador uma sensação semelhante. Tudo com muita sutileza e sensibilidade para que se tenha tempo de digerir o ocorrido.
O fato de poder perceber sentimentos profundos permite as pessoas a possibilidade de uma visão mais profunda e integrada de si mesma e a possibilidade de achar coisas novas no desconhecido. Aos poucos as pessoas podem recuperar através da memória de fatos traumáticos, uma outra representação mais afetiva.
3 – Depois da visita a dor de cada um, vemos que cada um, em sua historia, adquiriu a possibilidade de mudança frente a cada ente querido, mesmo que a morte já o tenha levado, mas passa existir um trabalho dentro de cada um a favor da vida, a favor do impulso de vida. A sensação é que a morte é algo belo e que merece ser reverenciada. O corpo também é aparentemente arrumado, maquiado e preparado para que no funeral esteja mais apresentado. O que o filme mostra é uma tradição japonesa que parece tornar mais bonita e menos impactante a morte, ao propor aos familiares verem o corpo do ente querido manipulado e preparado, supõe-se que o impacto talvez seja menos doloroso. Daigo descobre em sua vida as pequenas mortes inevitáveis no percurso de sua trajetória e a necessidade de renascimento que nos é proporcionado a cada virada de rumo na nossa vida. Oportunidades essas geralmente desperdiçadas, dado a nossa sempre ineficiente disposição a encarar a morte com olhos generosos.
O trabalho do nokanshi é então compreendido como uma função nobre, que “limpa” o morto e dá-lhe a beleza que era sua em vida, deixa-o da melhor forma possível para que sua partida deste mundo seja digna, para seu último adeus para a família seja belo. Um adeus triste e lamentador, seja como um momento de aceitação da pessoa como ela foi em vida ou como uma despedida feliz por terem vividos juntos e sido felizes.